Outubro Rosa e os direitos das mulheres com câncer de mama
É comum que mulheres diagnosticadas com câncer de mama sejam estigmatizadas e enfrentem estereótipos e preconceitos sociais. Ainda, a pressão estética que recai sobre essas mulheres em uma sociedade pautada em padrões de beleza muitas vezes inatingíveis é enorme. Ao terem que retirar suas mamas, as mulheres têm medo de serem vistas como menos “femininas” ou então perder sua “feminilidade”.
Beatriz Vendramini Rausse, Advogada, Mestre em Direito Europeu e Sócia da Borguezi e Vendramini Advogadas
O diagnóstico do câncer de mama vem carregado de muitos desafios. No entanto, tais desafios não devem ser encarados sozinhos e encontram apoio em inúmeros direitos garantidos pelo ordenamento jurídico brasileiro. É importante que os pacientes estejam bem informados de seus direitos para poder exigí-los das autoridades e profissionais que os assistem, garantindo um tratamento digno.
Os direitos começam desde o paciente que está com suspeita de câncer de mama, passando pelos pacientes que já foram diagnosticados e até mesmo por aqueles que já se curaram da doença.
Pessoas com suspeita de câncer de mama possuem o direito de realizar os exames necessários para a confirmação da doença no prazo máximo de 30 dias. Uma vez confirmado o diagnóstico, por determinação da Lei 12.732/12, o tratamento deve iniciar em até 60 dias com a realização de cirurgia ou com o início do tratamento radioterápico ou quimioterápico.
Ainda, segundo a Lei 9.797/99, é direito das mulheres com câncer de mama, independentemente de realizarem seu tratamento pelo SUS ou pelos planos de saúde, a realização de cirurgia plástica reparadora em ambos os seios, mesmo que a doença tenha acometido apenas um deles. Se possível tecnicamente, a cirurgia de reconstrução de mama deverá ser feita na mesma cirurgia de retirada do tumor. Não sendo possível, a paciente deverá ser encaminhada para acompanhamento e terá direito a realizar a cirurgia plástica reparadora em momento posterior. É também assegurada a substituição do implante mamário sempre que ocorrerem complicações ou efeitos adversos a ele relacionados, devendo tal procedimento ocorrer no prazo de 30 dias após a indicação médica.
No mais, as pessoas com câncer de mama atendidas pelo SUS devem receber todo o tratamento necessário para sua doença, o que incluiu, o diagnóstico, os procedimentos oncológicos e auxiliares, o fornecimento de medicamentos, insumos e tudo que se fizer necessário para o cuidado integral da saúde do paciente. A mesma obrigação é válida para os planos de saúde que têm o dever de cobrir todo o tratamento da pessoa com câncer de mama, sendo vedada a estes a prática abusiva de limitarem os prazos de internação de um paciente com câncer na UTI ou de não fornecerem os medicamentos e exames prescritos pelo médico.
O Art. 196 da Constituição Federal reconhece a saúde como direito fundamental de todos os cidadãos e dever do Estado. É importante salientar que o termo “saúde” vai muito além da ausência de doenças físicas, contemplando, também, o bem-estar mental, psicológico e emocional dos indivíduos. Assim, é responsabilidade do Estado garantir a promoção, a proteção e a recuperação da saúde em todos esses aspectos.
Desse modo, tendo em vista que a notícia de diagnóstico de câncer é desafiadora para qualquer pessoa, gerando impactos psicológicos e emocionais, o Estado conforme a Constituição Federal e, mais especificamente, o Estatuto da Pessoa com Câncer (Lei nº 14.238/21), deve promover políticas sociais públicas que garantam o bem-estar físico, psíquico, emocional e social da pessoa com câncer, garantindo o acesso à assistência psicológica e demais atendimentos especializados que se mostrarem necessários.
A pessoa com câncer de mama também têm direito à isenção de impostos. O artigo 6º, inciso XIV, da Lei 7.713/88 determina que ficam isentos do imposto de renda os rendimentos de aposentadoria ou reforma dos beneficiários que apresentem neoplasia maligna, no qual o câncer de mama se enquadra, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma.
Referida previsão legislativa advém de uma vontade do legislador de auxiliar as pessoas portadoras de doenças graves exemplificadas em lei a conseguirem prover seu tratamento. É um benefício para que o paciente possua mais recursos para enfrentar a doença e suas consequências.
Importa informar que, a pessoa com câncer de mama faz jus à concessão ou à manutenção da isenção do imposto de renda independentemente da contemporaneidade dos sintomas da doença e da recidiva da enfermidade.
Tanto os segurados do Regime Geral de Previdência Social (INSS), quanto servidores públicos que recebam suas aposentadorias da União, dos Estados ou Municípios, bem como pessoas que recebem aposentadorias privadas e pensão alimentícia possuem direito ao benefício.
O requerimento para isenção do IR pode ser feito administrativamente perante o próprio INSS ou autoridade pagadora da pensão ou reforma. Ocorre que muitas vezes essas autoridades se negam a conceder referido benefício alegando que a doença não está mais em atividade ou que não se enquadra em eventual neoplasia maligna ou nas outras hipóteses de doenças graves previstas na legislação.
Assim, quando há a negativa do órgão responsável pela concessão do benefício é necessário ingressar com ação judicial para a efetivação do direito da pessoa com câncer.
Nosso ordenamento jurídico, seja por meio da Constituição Federal ou de leis esparsas, visa garantir os direitos da pessoa com câncer e, em específico, da pessoa com câncer de mama. Existem Leis que obrigam o Estado, bem como todas as pessoas e entidades envolvidas na cadeia de combate e prevenção ao câncer de mama a proporcionarem um tratamento efetivo, adequado e com dignidade ao paciente. No entanto, muitas vezes os próprios responsáveis por aplicarem a legislação insistem em reiteradamente desrespeitá-la, resultando em uma realidade fática contrária aos direitos previstos em lei.
Resta concluir que no Brasil, principalmente para os pacientes pertencentes a classes sociais menos favorecidas, o tratamento e apoio oferecido estão longe de ser o ideal. No entanto, nesses casos, a Justiça acaba por ser uma grande aliada para a efetivação desses direitos, obrigando, através de determinações judiciais, que os direitos previstos cheguem efetivamente até seus beneficiários.