É hora do TCU se submeter ao STF
Eduardo Stênio Silva Sousa, membro da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados. Nos meus tempos de faculdade, contava-se uma anedota sobre um professor estrangeiro que veio visitar o Brasil e se intrigou com o pitoresco instituto da reclamação. Perguntou a um colega local do que se tratava e quando o brasileiro explicou que
- Eduardo Stênio Silva Sousa, membro da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados.
Nos meus tempos de faculdade, contava-se uma anedota sobre um professor estrangeiro que veio visitar o Brasil e se intrigou com o pitoresco instituto da reclamação. Perguntou a um colega local do que se tratava e quando o brasileiro explicou que era uma ação que poderia ser movida quando não se cumprisse uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) o visitante exclamou: como assim não cumprir uma decisão da Suprema Corte?
Exposto assim de maneira direta, o tema parece evidente. Estranho, realmente, precisarmos de um tipo processual específico para que se cumpram as decisões da Suprema Corte.
Mas estamos em terras tupiniquins e, por aqui, as coisas têm certas sutilezas. Vejamos, por exemplo, a questão da prescrição no Tribunal de Contas da União (TCU).
O tema está bem pacificado em ambas as turmas do STF: aplica-se a prescrição prevista na Lei nº 9.873/1999.
Nesse sentido, o acórdão proferido no julgamento do Agr em MS 38234 publicado em 1º.jun.2022, para citar o mais recente, em que a relatora, Ministra Rosa Weber, expressamente afirma, citando outros acórdãos, que a jurisprudência do STF é no sentido de que a Lei nº 9.873/1999 balize a atuação do TCU, quanto à imputação de débito e/ou à aplicação de sanção.
Essa decisão se ajunta a diversas outras decisões das duas turmas e várias outras decisões monocráticas suspendendo ou anulando condenações do tribunal de contas que não obedecem aos prazos da lei.
Deveria bastar para que o tribunal de contas se adequasse imediatamente ao entendimento da corte suprema do país.
No entanto, mesmo diante de diversos precedentes firmados por ambas as turmas do STF, o TCU resiste.
O TCU firmou posição de que é imprescritível sua análise no que se refere a prejuízo ao erário e de que se aplica o prazo decenal, previsto no Código Civil, para que o Tribunal de Contas aplique sanções.
No entanto, diante de diversas decisões contrárias do STF, o TCU decidiu instituir um grupo de estudos para analisar o tema. Todavia, enquanto não decide definitivamente sobre o assunto, a corte de contas continua julgando com base em seu entendimento, contrário às decisões do STF, com base no fundamento tecnicista de que não houve decisão da corte suprema com repercussão geral sobre a questão da aplicação da Lei nº 9.873/1999 aos processos no TCU.
Pode ser dizer que, de certo modo, o TCU criou uma espécie de efeito suspensivo do entendimento do Supremo enquanto decide se vai ou não se submeter a ele.
Pois bem, o imbróglio parece poder ter dia e hora para terminar: o TCU pautou para a sessão de quarta-feira, 31.ago.2022, às 14:30, processo cuja descrição é “Processo administrativo referente a projeto de ato normativo para regulamentar, no âmbito do Tribunal de Contas da União, a prescrição para o exercício das pretensões punitiva, de ressarcimento e executória, bem como identificar os possíveis impactos da prescrição nos processos mais relevante.”
Não discutiremos aqui o quão estranho é sequer considerar a necessidade de um ato normativo inferior para regular a aplicação da lei federal, mas o fato é que neste dia o TCU tem a oportunidade de assumir um compromisso com a segurança jurídica, com a firmeza das instituições e, porque não dizer, com o próprio estado de direito, se decidir adotar a posição já firmada pelo STF.
Caso contrário, se pretender se fiar no tecnicismo, perdemos todos, e precisaremos continuar explicando a visitantes que sim, precisamos de institutos para dizer, por vezes até mesmo para o próprio estado, que é necessário cumprir as decisões da corte suprema.