Mario Susumi Kuno Filho, membro do Almeida Prado & Hoffmann
O embate envolvendo o negociado versus o legislado se repercutiu de forma geral, desde a promulgação da Lei 13.467 de 2017, a denominada “Reforma Trabalhista”.
Isso porque não se trata de uma temática simples, diante dos casos e das decisões que refletem na aplicação de normas, discutindo-se a validade ou não da prevalência do negociado sobre o legislado.
Em outros dizeres, discute-se a prevalência do Direito Coletivo ou não sobre a lei (norma). Nesse aspecto, reside o conflito de preceitos individuais e de premissas coletivas, pois, na verdade, o que se almeja é, de forma segura, observar e pontuar, quando há conflitos de leis, qual norma se aplicará ao caso concreto.
Sobre o Direito Coletivo, verifica-se, por exemplo, que a Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) se trata de um contrato, possuindo natureza jurídica de ato-regra ou contrato-regra, detendo um acordo de vontade. (Entendimento emanado por Maurício Godinho Delgado. Em: DELGADO, M. G. Direito coletivo do trabalho. 7. ed. São Paulo: LTr, 2017. p. 166.).
No tocante à judicialização da temática, dados divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) demonstram que ao menos 50.346 processos estavam suspensos no tocante à temática da prevalência do negociado sobre o legislado.
Veja-se a tamanha repercussão da temática, visto que de um universo micro, a questão teve alcance nacional, significando dizer que empresas, trabalhadores, sindicatos, entre outros, terão que pactuar normas coletivas, conforme o melhor interesse da coletividade, sem afetar direitos individuais, certamente, e, respeitando a isonomia (artigo 5º, CF). Tarefa que parece trabalhosa, eis que, como visto, tramitam ao menos 50.346 processos, sem contar casos extrajudiciais, que podem vir à tona.
Quanto ao caso concreto propriamente dito, houve suspensão requisitada pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, ao apreciar leading case (Agravo em sede de Recurso Extraordinário número 1.121.633 – Tema 1.046) que discutia sobre a controvérsia envolvendo o tempo gasto pelo trabalhador no deslocamento entre a sua residência e o trabalho e vice-versa (horas in intinere).
Nesse aspecto, em 2022, o STF julgou o presente caso, apreciando-se o mérito da controvérsia, fixando a seguinte tese: São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis.
Ora, indubitavelmente, os reflexos econômicos serão enormes. Pois, num primeiro contraste, ecoa a seguinte indagação: como os Juízes de primeira instância vão decidir cada caso concreto? Como os Tribunais também decidirão?
Considera-se que juízes e tribunais observarão as decisões do STF, consagrando força vinculativa, nos termos do artigo 927, do CPC?
Veja-se que o artigo 8º, parágrafo 3º, da CLT, preconiza que no exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e balizará sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva.
Destaca-se o princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva, que se aplica em conjunto com o princípio da condição mais benéfica (cláusula mais vantajosa), aliado ao fato de que deve respeitar os direitos absolutamente indisponíveis, prevalecendo a vontade coletiva, como já exposto pela melhor Doutrina.
Ato contínuo, o artigo 611-A, caput, da CLT, dispõe que a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei, elencando-se rol de direitos que podem ser negociados.
Por outro lado, o artigo 611-B, da CLT, elenca os direitos que configuram objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho.
Ao seu turno, o artigo 7º, inciso XXVI, CF, assegura o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.
Ou seja, o STF reafirmou o que já estava previsto nas normas infraconstitucionais e constitucionais?
Parece que sim, no entanto, o que está em evidência consiste na uniformização da jurisprudência, mantendo-se estável, íntegra e coerente, conforme inteligência do artigo 926, do CPC.
Então, para o ano de 2023, no Direito do Trabalho, espera-se grandes questões, envolvendo a coletividade, com o fito de apaziguar a controvérsia, amadurecendo a temática do negociado versus o legislado.
Portanto, este período de amadurecimento é de suma importância, aplicando-se a tese fixada pelo STF, respeitando os direitos absolutamente indisponíveis.