Por Rafael Francisco de Oliveira
Uma questão que se encontra em evidência atualmente é a obrigatoriedade ou não de vacinação contra o COVID-19 em face de crianças. A Lei n. 8.069/90, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), prevê que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana. Neste contexto, a “recomendação do Ministério da Saúde é pela inclusão das crianças de 5 a 11 anos no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 (PNO), conforme posicionamento oficial da pasta declarado em consulta pública no dia 23 de dezembro de 2021.
A partir do momento que a agência sanitária e o próprio Ministério da Saúde recomendam determinada vacinação, ela passa a ser obrigatória, ressalvando-se, por óbvio, os casos em que existam laudos médicos atestando que a vacina possa gerar algum risco para a criança.
A Constituição Federal Brasileira esclarece que o direito à vida é uma garantia, destacando que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação e uma série de outras medidas. Assim, os detentores do poder familiar (pai, mãe ou responsável) possuem o dever de providenciar o acesso à vacina já autorizado pela ANVISA às crianças.
Na hipotética recusa injustificada de vacina de crianças a partir de cinco anos de idade sob seus cuidados, os pais podem ser formalmente advertidos pelas autoridades competentes, com a submissão da multa prevista no ECA, bem como à propositura de demandas judiciais inerentes a suspensão e perda do poder familiar e, em caso de morte por força da COVID-19, por crime de homicídio culposo (em tese).
Importante destacar novamente que o ECA é categórico: a vacinação das crianças é obrigatória nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias. A criança possui um direito subjetivo a ser submetida à vacina, o qual é exclusivo e pessoal do menor. Tanto é que no caso de recusa o Ministério Público possui legitimidade para assegurar este direito.
O Estado pode e deve proteger as pessoas mesmo contra suas vontades. O direito à saúde, art. 196 da Constituição, indica duas medidas estatais fundamentais para a sua efetivação: a adoção de políticas públicas que evitem o risco de agravos à saúde e a garantia de serviços públicos assistenciais de acesso universal e igualitário, a cargo dos entes federativos integrados em rede interfederativa, no âmbito do Sistema Único de Saúde. O princípio da segurança sanitária impõe dever ao Estado de preservação da saúde das pessoas que não devem adoecer por motivos evitáveis, ação estatal primordial, conforme determinação constitucional.
Logo, o Estado pode (e deve), em situações excepcionais, proteger as pessoas mesmo contra a sua vontade, já que a vacinação é importante para a proteção de toda a sociedade, não sendo legítimas escolhas individuais que afetem gravemente direitos de terceiros. O poder familiar não aprova que os pais, invocando qualquer espécie de convicção, coloquem em risco a saúde dos filhos.
Portanto, não existem dúvidas quanto a obrigatoriedade de pais (ou responsáveis legais) providenciarem a vacinação de crianças, sob pena de responsabilização cível, administrativa ou criminal.
Por fim, o Supremo Tribunal Federal, ainda no ano de 2020, decidiu que a obrigatoriedade da vacinação é constitucional, e que o direito à saúde coletiva das crianças deve prevalecer sobre a liberdade de consciência e convicção filosófica das famílias.
Diante de todo o exposto, e com lastro no princípio da paternidade responsável (o qual significa responsabilidade), patente o dever de vacinação das crianças, já que esta paternidade se tornou legal, consubstanciada em regras e princípios constitucionais, dentre eles os princípios da dignidade humana, da responsabilidade e da afetividade.