Por Diego Starling
Certa vez, o geógrafo e escritor político francês André Siegfried (1875-1959) relatou o espanto de um negociante da Filadélfia ao perceber que, no Brasil, para se conquistar um freguês, era necessário fazer dele um amigo. Embora a observação tenha sido feita ainda no século passado, pouca coisa mudou em relação ao modo de fazer negócio dos brasileiros. A pesquisa mais recente e de maior projeção sobre o tema, realizada ainda em 2012 pelo LinkedIn com pessoas do mundo inteiro, apontou que o brasileiro é o profissional que mais teme a negociação – entre os brasileiros entrevistados, 21% revelaram ter medo de negociar, enquanto a média global girava em torno de 6%.
Inúmeras razões podem tentar explicar o resultado negativo do Brasil no estudo da rede social americana. O próprio levantamento lista algumas delas, como medo, ansiedade, confiança e empolgação. Contudo, elencar apenas quatro possíveis motivos é limitar a característica de um povo tão abundante e diversificado como o brasileiro.
Outra pesquisa, dessa vez realizada pela Pactive Consultoria, de Curitiba, em 2016, reduziu o escopo de entrevistados – foram consultadas somente pessoas nascidas e criadas no Brasil – e acrescentou novos motivos para esse temor em negociar. A análise ainda levou em consideração aspectos como aversão a conflitos, falta de material apropriado, falta de preparo e vergonha em defender os próprios interesses.
Curiosamente, o tópico que gerou maior identificação com os entrevistados foi justamente a aversão a conflitos. Quase metade (45,3%) dos participantes justificaram que temem a negociação pelas implicações negativas que um potencial conflito venha a ter.
Diante de todas essas informações, chega a ser impossível não lembrar de Sérgio Buarque de Holanda com sua teoria do “homem cordial”, na qual sugere que o caráter do brasileiro foi moldado com base em atributos como a amabilidade no trato, a hospitalidade e a generosidade. Entretanto, afirma o sociólogo, as pessoas daqui não suportam o peso da individualidade, precisando “viver nos outros”.
Desse modo, a negociação se tornou um paradoxo no Brasil: o indivíduo, que negocia em todos os ambientes sociais e a todo momento, nega estar negociando e ainda acrescenta que não o faz a fim de manter a política da “boa vizinhança”.
Ao observar esse tipo de comportamento ainda no século XIX, o naturalista norte-americano Herbert Smith escreveu que os brasileiros estão “expiando os erros dos seus pais, tanto quanto os próprios erros. A sociedade foi mal formada nessa terra, desde as suas raízes”. Cerca de duzentos anos depois, é triste constatar que continuamos expiando os erros de nossos pais.
Contudo, a única maneira de modificar isso é seguindo a sugestão do próprio Smith, que recomenda uma “revolução”, que nada mais seria do que a mudança – no caso do Brasil, um amadurecimento – do pensamento geral.
Isso feito, é possível projetar que daqui a alguns anos, outras gerações de brasileiros ficarão espantadas, assim como o negociante da Filadélfia citado por Siegfried, ao saberem que no Brasil de seus antepassados, para se conquistar um freguês, era necessário fazer dele um amigo.