Por Dalmo Jacob
O cenário tributário brasileiro tem sido marcado por uma longa batalha entre contribuintes e a legislação que rege a compensação de créditos originados de disputas judiciais. No centro dessa controvérsia está o artigo 170-A do CTN (Código Tributário Nacional), uma cláusula que há mais de duas décadas tem sido um obstáculo para os contribuintes em suas tentativas de compensação antes do trânsito em julgado das decisões.
Recentes eventos judiciais, incluindo a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na ADI nº 4.296 e o cancelamento pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) da Súmula 212, evidenciam a obsolescência desse artigo e clamam por sua revogação imediata.
Quando o artigo 170-A foi inserido no CTN pela LC nº 104/2001, o objetivo era claro: evitar a perda de arrecadação decorrente de decisões liminares que, eventualmente, poderiam ser reformadas. Na época, havia preocupações legítimas sobre a possibilidade de uma única empresa obter liminares para compensação, enquanto outras em situações econômicas similares não o faziam.
No entanto, o contexto jurídico mudou consideravelmente desde então. A Emenda Constitucional nº 45/04 e outras reformas legislativas posteriores delinearam princípios fundamentais em matéria processual, garantindo a celeridade processual e a aplicação vinculante das decisões dos tribunais superiores.
Com esse novo panorama legal, as críticas à vedação estabelecida pelo artigo 170-A são numerosas e abrangentes. A inconstitucionalidade é uma delas, bem como a interpretação desatualizada em relação ao complexo de normas constitucionais e infraconstitucionais vigentes.
O debate sobre esse artigo foi reacendido com a decisão do STF na ADI nº 4.296, que declarou inconstitucional o §2º do artigo 7º da Lei do Mandado de Segurança. O STF optou por priorizar o poder geral de cautela do juiz em detrimento de uma vedação genérica, reconhecendo que a legislação de direito material já prevê regras capazes de guiar o magistrado.
O cancelamento da Súmula 212 pelo STJ foi uma tentativa de conciliar sua jurisprudência com a decisão do STF, reconhecendo a necessidade de revisão das práticas judiciais em relação à compensação de tributos.
Diante desses acontecimentos, juristas têm defendido a mitigação da literalidade do artigo 170-A, permitindo que juízes concedam liminares para compensação tributária em casos onde o crédito decorre de tese definida por precedente vinculante. Essa mudança de postura revela que a muralha criada há duas décadas está começando a ruir sob o peso da evolução jurídica.
O contexto atual, marcado pela busca por eficiência, celeridade e segurança jurídica, demanda uma revisão urgente do artigo 170-A. É hora de o legislador priorizar os princípios constitucionais que protegem os direitos dos contribuintes, em vez de manter uma legislação ultrapassada que coloca uma carga injusta sobre o judiciário. A revogação desse artigo é crucial para restaurar a equidade e a justiça no sistema tributário brasileiro.