Por Juliano Zorzi, Victor Domingues e Beatriz Martins
No dia 30 de dezembro foi promulgada a Lei Federal nº 14.285/2021, que trouxe alterações ao atual Código Florestal – Lei Federal nº 12.651/2012 – especialmente a respeito da utilização de Áreas de Preservação Permanente (APPs) em margens de rios e córregos (conhecidas como matas ciliares) localizadas em zonas urbanas consolidadas.
Com as recentes alterações, os municípios passam a deter autonomia para regulamentar esse tipo de ocupação em zonas urbanas consolidadas, assim consideradas aquelas que: (i) estão inseridas no perímetro urbano com base no plano diretor municipal; (ii) apresentam uso predominantemente urbano (caracterizado pela existência de edificações residenciais, comerciais, industriais, institucionais e/ou destinadas à prestação de serviços); e (iii) dispõem de equipamentos mínimos de infraestrutura, incluindo sistema viário implantado.
Antes da publicação da nova lei, a extensão das APPs, ainda que em zona urbana, deveria obedecer os recuos definidos no Código Florestal – de 30 a 500 metros, dependendo da largura do corpo hídrico. Com a nova lei, já em vigência, os limites das APPs marginais de qualquer curso d’água natural em área urbana consolidada poderão ser alterados (inclusive reduzidos) pelos planos diretores e leis municipais de uso e ocupação do solo, ouvidos os conselhos estaduais e municipais de meio ambiente.
A lei visa apaziguar os conflitos existentes entre as legislações municipais e federal, que não raramente divergem sobre a extensão das APPs em margens de rios e córregos. A lei inova ao estabelecer expressamente a predominância da legislação municipal específica – até então, a maior parte dos tribunais entendia que deveriam prevalecer as disposições mais restritivas do Código Florestal, sujeitando vários empreendimentos, aprovados com base em normas municipais, a sentenças condenatórias de demolição.
A lei orienta-se pelo princípio da autonomia dos municípios e reforça o entendimento de que questões ambientais devem ter resolução local, com base nas características e realidades individuais de cada cidade, incluindo aspectos geográficos e taxas de ocupação e desenvolvimento.
Sob o argumento de representar diminuição da proteção ambiental das matas ciliares a constitucionalidade da lei poderá ser atacada. Em outro confronto com o Código Florestal, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o Código Florestal deveria prevalecer sobre a Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei nº 6.766/1979), que previa o recuo mínimo de 15 metros, sob o argumento de que a mais ampla garantia ambiental devesse prevalecer.