Mudanças implementadas na Lei de Improbidade impacta recursos repetitivos no STJ
A Lei 14.230/2021 promoveu significativas alterações no texto anterior da lei de improbidade administrativa, extirpando alguns procedimentos e tipos de improbidade, estabelecendo novas regras de prazos prescricionais, trazendo um conceito mais preciso sobre aquilo que de fato é considerado dolo, eliminando, de vez, o ato culposo como caracterizador de conduta ímproba, além de ter estabelecido vários outros regramentos que passaram a ser previstos ou que foram disciplinados de maneira a tornar o procedimento mais claro, dinâmico e eficiente.
¨*** Rafaella Bahia Spach e Bruna Silveira Sahadi, advogadas na Manesco Advogados
A Lei 14.230/2021 promoveu significativas alterações no texto anterior da lei de improbidade administrativa, extirpando alguns procedimentos e tipos de improbidade, estabelecendo novas regras de prazos prescricionais, trazendo um conceito mais preciso sobre aquilo que de fato é considerado dolo, eliminando, de vez, o ato culposo como caracterizador de conduta ímproba, além de ter estabelecido vários outros regramentos que passaram a ser previstos ou que foram disciplinados de maneira a tornar o procedimento mais claro, dinâmico e eficiente.
Dentre os reflexos das modificações que sofreu a lei de improbidade administrativa está o recente cancelamento da afetação do Tema 1.042 pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. O tema, afetado para ser julgado sob o regime dos repetitivos, buscava discutir a figura do reexame necessário nas ações de improbidade administrativa, mas a Lei 14.230/2021 aboliu a figura do reexame necessário, de forma que a controvérsia que seria alvo de discussão pela Corte Superior esvaziou-se por completo.
Essa desafetação dá espaço ou ao menos revela que outros temas repetitivos, afetados ainda sob a vigência da lei anterior, e também relacionados às ações de improbidade administrativa, podem ter a sua afetação cancelada. É o caso do Tema 1.096, que visa discutir “se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)”.
A aludida controvérsia fazia sentido antes do advento da Lei 14.230/2021, porquanto, embora o artigo 10 da LIA tipificasse como conduta ímproba aquela que causasse lesão ao erário, o Superior Tribunal de Justiça construiu a sua jurisprudência em torno da figura do dano in re ipsa, especialmente nos casos em que se discutia dispensa indevida de licitação (artigo 10, inciso VIII da Lei 8.429/92). Ou seja, para que fosse imputada uma condenação pela prática do ato de improbidade previsto no artigo 10 da LIA, o STJ aceitava o dano presumido, autorizando, assim, uma situação em que o agente público era condenado por uma ficção, ou seja, apenas pela possibilidade de que não tenha contratado a melhor proposta
O Ministro Gurgel de Faria, em caso de sua Relatoria (REsp 1.328.789/SP), destacou que “o prejuízo para configuração do ato de improbidade de dispensa indevida de licitação (art. 10, VIII, da Lei n. 8.429/1992) é presumido (in re ipsa), consubstanciado na impossibilidade da condenação pela Administração da melhor proposta, sendo desinfluente a prestação do serviço contratado”.
Essa discussão, porém, parece ter perdido força a partir da vigência da Lei 14.230/2021, eis que, por meio dela, o tipo descrito no inciso VIII do art. 10 passou a contar a exigência da perda patrimonial efetiva.
Disso se infere que, qualquer discussão, que dirá, aprovação da presunção de prejuízo ao erário (dano in re ipsa) para a caracterização da improbidade por dispensa indevida de licitação ou frustração do procedimento licitatório, alvo do Tema 1096, seria contra legem, pois está totalmente dissociada do novo texto da lei de improbidade administrativa, que passou prever com requisito obrigatório para configuração da improbidade administrativa decorrente da frustação do procedimento licitatório, a prova de dano efetivo ao erário.
Assim sendo, espera-se que o Superior Tribunal de Justiça, a exemplo do que fez no Tema 1.042, entenda que diante da redação atual da lei de improbidade administrativa, não há mais o que ser decidido quanto ao Tema 1.096/STJ.