O papel do TCU na transição do Governo Federal
Períodos de transição de governo são sempre delicados, principalmente como o que se enfrenta no Brasil: bipolarização, após a eleição presidencial mais acirrada e da primeira tentativa de reeleição malsucedida na histórica da República. Assim, não há dúvidas de que o cenário político expõe o Brasil a um ambiente de negócios desfavorável.
*** Juliana Raffo, coordenadora da área cível e de contratos públicos do Briganti Advogados, especialista em Direito Civil e Empresarial
Períodos de transição de governo são sempre delicados, principalmente como o que se enfrenta no Brasil: bipolarização, após a eleição presidencial mais acirrada e da primeira tentativa de reeleição malsucedida na histórica da República. Assim, não há dúvidas de que o cenário político expõe o Brasil a um ambiente de negócios desfavorável.
Essa transição ocorre, também, às vésperas da prestação de contas anuais, em que o novo governo submeterá as contas do governo anterior ao Tribunal de Contas da União (TCU). É nesse julgamento de contas que o TCU, ao aprová-las, muitas vezes o faz com ressalvas ou recomendações, indicando pontos que a Administração Pública deve aprimorar para obter processos e contas mais transparentes e eficientes.
Mais do que nunca, o país está atento ao processo de transição presidencial, previsto na Lei 10.609/2002, que dá condições de que o presidente eleito receba do governo anterior todas as informações necessárias para implantar seu programa de governo, sem prejudicar, de outro lado, a continuidade de serviços e políticas públicas.
Neste ano, de forma inédita, o TCU instituiu uma comissão coordenada pelo Presidente da Corte ,Ministro Bruno Dantas, para acompanhar esse processo, apoiando a equipe de transição.
O TCU apresentou a chamada Lista de Alto Risco composta por 29 áreas de atenção, com pontos que o Ministro Bruno Dantas chamou de “riscos como vulnerabilidade à fraude, desperdício, abuso de autoridade, má gestão ou necessidade de mudanças profundas nos objetivos ou na execução dessas políticas públicas”.
Essa lista é, de certa forma, um “dever de casa” para o novo governo: para que uma área saia desse monitoramento, serão avaliados o comprometimento da gestão, a capacidade de solução do problema, os planos de ação seu monitoramento, demonstrando que houve progresso pelo governo.
O TCU entendeu, por exemplo, que o Programa Bolsa Família é o mais eficiente no combate à pobreza e a desigualdade social, o que tende a manter o modelo e critérios de elegibilidade em funcionamento, dadas a bandeira ideológica levantada pelo governo eleito ligada ao combate a pobreza.
Já na área de saúde, o TCU traz um diagnóstico sobre questões estruturantes do Sistema Único de Saúde (SUS), como o programa de imunização, e com relação ao COVID-19, apontou que não há informações suficientes para avaliar se as metas de imunização foram atingidas em cada grupo incluído no plano nacional de vacinação.
Outro tema polêmico e de diferente posição entre os governos Bolsonaro e Lula foi avaliado pelo TCU: as privatizações. Neste tema, o papel do TCU é garantir a segurança jurídica e a transparência com o que os modelos de desestatização serão adotados e antecipar riscos que poderiam, em alguns anos, tornar-se disputas financeiras, o que arriscaria a manutenção dessas privatizações, os investimentos, e a continuidade das operações desestatizadas. Com base no trabalho de transição, representantes do governo eleito já se manifestaram pela paralisação de processos de desestatização importantes, como o do Porto de Santos e dos Correios.
Espera-se que essa atuação do TCU na transição presidencial faça um contraponto ao desgaste político e passe aos investidores a visão de que o Brasil é composto por instituições democráticas fortes, com uma Corte de contas focada em promover uma administração federal mais eficiente, ética e transparente, o que influenciará, certamente, a decisão por trazer ou desenvolver negócios no país.