Por Daniel Cerveira*
É esperado que os contratos de locação de espaços em shopping centers sejam rotineiramente atualizados, de modo atender às mudanças da sociedade, legislação etc.
Nesse sentido, os novos instrumentos gerados pelos empreendedores trazem dispositivos que antes não existiam nas avenças, tais como as previsões da interligação de sistemas para apuração do aluguel percentual e a respeito de vendas a serem realizadas através dos sites dos centros de compras.
O problema é que alguns shoppings estão incluindo nos pactos cláusulas leoninas e extremamente prejudiciais aos lojistas, lembrando que é notória a disparidade de forças, ou seja, não há dúvidas de que os centros de compras têm poder de negociação suficiente para impor as condições contratuais aos seus inquilinos.
Seguem abaixo alguns exemplos que vêm sendo observadas no mercado e respectivos comentários:
1. Obrigação do lojista devolver descontos concedidos, além do pagamento da multa rescisória, na hipótese da devolução antecipada do imóvel. O STJ e outros Tribunais já proferiram decisões no sentido de que é proibida tal estipulação, pois configura o chamado bis in idem, isto é, a fixação de uma dupla penalidade para o mesmo fato gerador.
2. Em caso de retomada da loja pela locadora em sede de ação renovatória, por melhor oferta de terceiro, a indenização assegurada em lei à locatária seria limitada a 6 aluguéis propostos pelo terceiro. A cláusula fere o espírito da Lei do Inquilinato e configura enriquecimento ilícito, tampouco trata de hipótese de negócio juridico processual, vez que cuida de direito manifestamente material.
3. Caso o lojista descumpra alguma cláusula, todos os contratos firmados com a rede de shopping centers respectiva serão considerados afetados e, portanto, todas as lojas ficariam sujeitas a despejo. Esse dispositivo é conhecido como cláusula de “cross default”. No caso de locações comerciais, cuja legislação é de interesse público, é evidente que essas cláusulas são nulas, visto que não ser razoável que, por uma falha em determinada operação, a rede varejista perca pontos comerciais localizados em outros shoppings e, por consequência, os fundos de comércio constituídos.
4. Obrigação do lojista aderir ao marketplace e sistemas de “giftback”, com a criação de novas taxas calculadas sobre as vendas geradas por essas plataformas. Além de ser uma intromissão nas atividades dos comerciantes, os quais cada um possui suas respectivas margens e capacidade de estocagem, a cobrança de percentuais sobre essas transações impacta diretamente no resultado dos estabelecimentos, visto que já é cobrado o aluguel percentual com base no faturamento, ou seja, da forma que alguns shoppings pretendem funcionar, os lojistas arcariam com custos em duplicidade.
*Daniel Cerveira, sócio do escritório Cerveira, Bloch, Goettems, Hansen & Longo Advogados Associados. Autor dos livros “Shopping Centers – Limites na liberdade de contratar”, São Paulo, 2011, Editora Saraiva, e “Franchising”, São Paulo, 2021, Editora Thomson Reuters Revista dos Tribunais, prefácio do Ministro Luiz Fux, na qualidade de colaborador. Consultor Jurídico do Sindilojas-SP. Colunista do site Central do Varejo. Integrante da Comissão de Expansão e Pontos Comerciais da ABF – Associação Brasileira de Franchising. Pós-Graduado em Direito Econômico pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV/SP) e em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Atuou como Professor de Pós-Graduação em Direito Imobiliário do Instituto de Direito da PUC/RJ, MBA em Gestão em Franquias e Negócios do Varejo da FIA – Fundação de Instituto de Administração e Pós-Graduação em Direito Empresarial da Universidade Presbiteriana Mackenzie.