Especialista internacional em direito penal comenta sobre suposta utilização da ABIN de forma ilegal pelo ex-presidente Jair Bolsonaro
De acordo com o Dr. Eduardo Maurício, quando essas atribuições são desrespeitadas e usadas para benefício próprio, é fundamental que os responsáveis sejam punidos criminalmente
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), retirou nesta quinta-feira, 11, o sigilo da Operação Última Milha. Desde o ano passado, a operação investiga o possível uso ilegal de sistemas da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) para espionar autoridades e desafetos políticos durante o governo Jair Bolsonaro. Essas ações clandestinas tinham o objetivo de levantar suspeitas sobre a credibilidade do sistema eleitoral.
Entre as autoridades e desafetos políticos supostamente espionados de forma ilegal e abusiva estão ministros do STF, como Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luiz Fux e Luis Roberto Barroso, além de diversos membros do Poder Legislativo, do Poder Executivo e jornalistas. Em uma operação da Polícia Federal deflagrada no mesmo dia, foram autorizados cinco mandados de prisão e sete mandados de busca e apreensão. Essa operação surgiu das investigações do inquérito das fake news, onde a Polícia Federal descobriu que membros dos três poderes e jornalistas foram alvos de perfis falsos e disseminação de informações falsas.
Analisando o processo, que não é mais sigiloso, constata-se que o grupo procedeu no acesso ilegal e abusivo aos computadores, celulares e infraestrutura de telecomunicações para monitorar pessoas e autoridades públicas. Isso pode levar à responsabilização penal dos investigados por crimes como organização criminosa, interceptação clandestina de comunicações telefônicas, invasão de dispositivo informático e tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito.
No âmbito da operação Última Milha, a ABIN utilizou um programa secreto chamado FirstMile para monitorar a localização de alvos pré-determinados por meio de aparelhos celulares. A Polícia Federal identificou que essa ferramenta foi usada para monitorar políticos, jornalistas, advogados e adversários do governo Bolsonaro.
O software contratado pela ABIN e utilizado irregularmente era o FirstMile, comercializado pela empresa israelense Cognyte. Apesar do encerramento formal do contrato em 2021, há indícios de que o uso do sistema se intensificou nos últimos anos do governo Bolsonaro para monitorar ilegalmente servidores públicos, políticos, policiais, advogados, jornalistas e até mesmo juízes e integrantes do STF.
Eduardo Mauricio, advogado no Brasil, em Portugal, na Hungria e na Espanha, e doutorando em Direito com foco em Justiça, Sistema Penal e Criminologia, comenta, “a ABIN possui atribuições específicas que envolvem a obtenção e análise de dados para assessorar o Presidente da República, proteção de conhecimentos sensíveis, avaliação de ameaças à ordem constitucional e o desenvolvimento de recursos humanos na área de Inteligência. Quando essas atribuições são desrespeitadas e usadas para benefício próprio ou de um grupo (favorecimento pesssoal), é fundamental que os responsáveis sejam punidos criminalmente para reestabelecer a ordem e proteger o Estado Democrático de Direito e a dignidade da Justiça.”
Eduardo destaca a gravidade das ações reveladas pela Operação Última Milha, “o uso de sistemas da ABIN para espionagem ilegal é uma violação flagrante das normas constitucionais e das funções da Agência. É imperativo que haja uma resposta judicial firme para evitar a repetição desses abusos e garantir a transparência e a integridade das instituições democráticas.”
As investigações continuam, e a sociedade aguarda o desfecho deste caso que coloca em xeque a utilização de recursos estatais para fins ilícitos e a manipulação política.