Por Thomas Law
Viver a advocacia na era digital é um desafio emocionante para os jovens advogados, mas também para as entidades que os representam. Neste contexto, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é uma aliada crucial nesse percurso dinâmico. À medida que o direito se transforma em resposta aos avanços sociais, tecnológicos e econômicos, a OAB precisa desempenhar um papel vital: garantir que os novos profissionais estejam preparados para o cenário que encontrarão no mercado atual e futuro.
Esse papel tem especialmente relevância se considerarmos que a advocacia no Brasil é jovem – 52% dos 1,37 milhão dos membros têm menos de 10 anos de carreira, sendo a maioria feminina (51% são mulheres). Eles recebem menos de cinco salários mínimos por mês, o equivalente a R$ 6,6 mil, segundo o estudo Demográfico da Advocacia Brasileira (PerfilAdv), realizado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) em 2023.
Os números acima nos dão sinais claros de que a sociedade passa por uma profunda transformação que se reflete também no âmbito jurídico. A OAB, enquanto entidade representativa dos advogados, precisa se adaptar a essas evoluções, tanto no campo da inovação tecnológica quanto no das mudanças nas demandas sociais. Essa movimentação se faz necessária especialmente para os jovens advogados. Na prática, isso significa ir além de ser uma instituição que outorga a carteira profissional, consolidando-se como uma parceira que entende as nuances do mundo jurídico contemporâneo.
Por outro lado, temos os advogados mais experientes. A globalização e a revolução tecnológica trouxeram grandes desafios para o tradicional campo jurídico. A OAB precisa promover debates, oferecer cursos e atualizações para seus membros, a fim de capacitá-los constantemente a lidar com as questões emergentes, como o direito digital, a inteligência artificial e a proteção de dados. Além disso, deve desempenhar um papel fundamental na promoção da inclusão e diversidade na área, proporcionando oportunidades igualitárias para todos os profissionais, independentemente de sua origem, gênero ou raça.
A entidade está diante da oportunidade de se adaptar às demandas contemporâneas, tornando-se uma fonte essencial de apoio, orientação e oportunidades de crescimento profissional. Também precisa defender a sua importância no sistema legislativo do país, caso deseje ser protagonista nesse processo de mudanças. Isso inclui não apenas fornecer informações e proximidade com a entidade, mas também conceder acesso a serviços e recursos essenciais, como assistência jurídica gratuita, seguro de responsabilidade civil e orientação sobre questões éticas e profissionais.
Além disso, é preciso oferecer oportunidades de networking, desenvolvimento de carreira e se fortalecer como hub da advocacia, por meio de treinamentos, programas de mentoria e iniciativas para o bem-estar psicológico e emocional do advogado. Tais medidas podem garantir que a profissão seja acessível a todos, atuando para a construção de uma justiça mais equitativa e necessária.
Além disso, a internacionalização dos pequenos e médios escritórios de advocacia é um tema de extrema importância diante do avanço da era digital, da internet e da revolução 4.0. Os tratados internacionais e as leis esparsas têm se mostrado particularmente relevantes, especialmente no que diz respeito à proteção de dados e à inteligência artificial, com destaque para as legislações da União Europeia, conhecidas como o efeito Bruxelas.
Em outras palavras, a LGPD do Brasil é resultado da influência e do impacto da legislação da União Europeia, como a GDPR (General Data Protection Regulation). Por exemplo, qualquer loja online no Brasil ou em qualquer outro país terá que se adaptar à GDPR se desejar enviar produtos para clientes na União Europeia. Nesse contexto, a OAB também deve se mostrar presente e atenta às questões internacionais, oferecendo intercâmbios profissionais, fornecendo cartilhas didáticas e informações sobre os impactos da revolução 4.0 na advocacia brasileira.
O campo da advocacia, por sua própria natureza, está intrinsecamente ligado à evolução da sociedade, e a OAB, como sua guardiã, não pode permanecer alheia a esse processo. A entidade, especialmente no estado de São Paulo, deve manter uma atuação ágil e um monitoramento constante das legislações e das pautas relevantes para a advocacia, tanto na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP) quanto na Câmara Municipal de São Paulo e em outros municípios. Por exemplo, o aumento da taxa judiciária do ano passado poderia ter sido objeto de um debate mais amplo e, no lugar de uma alíquota 1,5% mais alta, poderia ter havido um aumento gradual. Além disso, a proposta de majoração de 1% para 2% da execução merecia uma análise mais detalhada.
A modernização da legislação brasileira e paulista deve ser guiada pela análise da advocacia. Assim como a China Law Society e a Ordem dos Advogados da China desempenham esse papel na China, o American Bar Association (Ordem dos Advogados dos EUA) trabalha com a iniciativa “rule of law”, que visa promover a justiça, oportunidades econômicas e a dignidade humana através do estado de direito. Além disso, a Ordem dos Advogados de Portugal contribui para o processo legislativo conforme estabelecido no Estatuto local. Entendo que a OAB de São Paulo e a OAB Nacional podem e devem desempenhar papel semelhante no Brasil.
É preciso ter voz firme na preservação da independência do advogado, na defesa do estado democrático de direito e na promoção da justiça social, bem como reconhecer os avanços significativos que a instituição alcançou para se adaptar às transformações do direito. Ao mesmo tempo, também é necessário reafirmar seu compromisso com a ética, a liberdade, a justiça e os valores fundamentais que sustentam a advocacia brasileira.
Thomas Law é advogado, doutor em Direito Comercial pela PUC/SP, advogado e presidente do IBRACHINA (Instituto Sociocultural Brasil e China)